Sobre propósito

 Chegamos a meio do mês de Maio e poucos são as entradas que adornam este blog. A razão do meu silêncio, caso os meus leitores se estejam a perguntar, não se deve à falta de ideias (tenho como sempre uma lista de tópicos a abordar e outros guardados em rascunho que posso ou não publicar ainda nos meses respetivos em que os idealizei). A razão do meu silêncio deve-se a uma sensação lancinante de falta de propósito. De vazio interior. De procura de sentido não só na escrita, no meu trabalho mas também na minha vida. Confesso que ainda não encontrei todas as respostas mas quero partilhar convosco algumas conclusões a que cheguei.
Nós, pessoas, apregoamos as virtudes da constância, de ter uma estrutura fixa, de ser consistente com hábitos, práticas e comportamentos. De ter uma espécie de organização mental e externa que seja um atalho fácil para o sucesso. Raramente nos perguntamos o que significa o sucesso verdadeiramente para nós. Só sabemos que a vida é como uma corrida de hamsters e não queremos ficar para trás. Ficar para trás implicaria pensar e repensar, sentir a dor, a perda e a derrota e ninguém poderia alguma vez querer isso, verdade? Procuramos fórmulas mágicas, milagres, receitas para nos tornarmos virais, ou pelo menos, fáceis de compreender pelos outros, tão palatáveis como um daqueles comprimidos para acelerar a digestão. Esquecemo-nos que não controlamos tudo. Esquecemo-nos que na dimensão do Universo, na escala macroscópica da Vida, controlamos muito pouco. Somos apenas um grão de areia num deserto imenso. E isso não tem de ser necessariamente mau. Passo a explicar: penso que qualquer um de nós tem tendência a se ver no centro, como ponto de referência, o ego vai puxando os cordelinhos sem sequer nos apercebermos e facilmente nos torna fantoches. Reféns da necessidade de sermos amados. De sermos compreendidos. De sermos aceites pelos outros. Porque afinal o Homem é um ser social, nenhum ser humano é uma ilha e nenhum de nós sobrevive sozinho.
O que tem todo este discurso a ver com propósito? Tudo, na verdade. Porque quando os aplausos não estão lá, quando as luzes se apagam e mergulhamos na mais completa frustração, quando combatemos demónios que mais ninguém parece ver, é fácil sentirmo-nos perdidos e numa ausência total de motivação para o que quer que seja.
É nesse esforço de me compreender a mim mesma, aos meus estados de alma que escrevo estas linhas. Não é preciso ter uma doença mental diagnosticada (no meu caso, doença bipolar) para sentir que estamos a lutar uma batalha. Toda a gente tem problemas e as doenças, seja de que ordem forem, são apenas barreiras artificiais, rótulos que por vezes nos afastam do que é comum a todos: a nossa humanidade. 
Como resolvemos esse mal-estar? Duas palavras estão no topo da minha cabeça: aceitação e paciência. Aceitar que a minha energia tem fases de quebra, que preciso de abrandar, ter os meus momentos de pausa para recuperar. Que preciso de perder para saborear melhor as vitórias. Que preciso de conhecer a desilusão para saber o valor da alegria. Sentir a pesada angústia para reconhecer a leveza da paz interior. É nisso em que, a meu ver, consiste estarmos bem resolvidos. Não tentarmos ser perfeitos mas fazermos o nosso melhor a cada dia para podermos acabar o dia, repousar a cabeça na almofada e dormirmos tranquilos. Saber que estamos a tomar decisões com lucidez e que se coadunam com os nossos objetivos, sem nunca comprometer a nossa integridade.
O propósito encontra-se em enfrentar o palco da nossa mente e em estar presente todos os dias, mesmo naqueles mais duros ou em que nos apetecia estar em qualquer outro lugar. Em conseguir olhar as trevas nos olhos e estar disposta a atravessá-la para emergir do outro lado. Porque ninguém nos pode fazer sentir inferiores sem o nosso consentimento. Porque as ações ficam para quem as pratica. Porque podemos culpabilizar quem quisermos quando estamos a sofrer, mas mais cedo ou mais tarde temos de assumir a responsabilidade pelo que é só nosso: a nossa capacidade de transformação.

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