Dualidades


Coração e cérebro encontram-se amiúde em direcções diametralmente opostas que nos obrigam a pesar os argumentos e metodologia do primeiro face às sensações tão poderosas quanto ilógicas do segundo. É como caminhar com um vaso sobre a cabeça avançando de forma muito precária, numa luta opulenta e infindável pela totalidade, porque não sabemos bem onde devemos ir nem se aguentamos que alguma coisa seja deixada para trás.

Podemos falar através de formas diversas: pela oralidade, pelas escrita, pela comunicação gestual, por sinais. Podemos murmurar, entoar, gritar, sussurrar, cantar. Inventamos então um cântico, composto de letra e melodia, como pão e água, osso com carne, tão duais e indivisíveis como um moribundo agonizando no leito. Se não fizermos a cama aos sentimentos e raciocínios que os acompanham, vamos gerar pensamentos descompassados, tão caóticos como furacões que varrem cidades inteiras impunemente.


“Demonstrate” é uma canção novinha em folha da cantora norte-americana Jojo que é tudo o que muitos apreciadores de música procuram: súbtil, calmante, sedutora, bem produzida e ainda melhor cantada. Alude à necessidade que por vezes temos de esconder-nos no nosso próprio mundo, em fantasias que se amplificam e tornam realidade, em que a poesia da pele é simples e clara, em que a pressão se desvanece dos sentidos e a carne se imbute de significado. Que no meio de tanta dor e crise, consigamos demonstrar de alguma maneira o que os nossos lábios não conseguem dizer, encontrar refúgios onde póssamos ter descanso e manter perto quem realmente amamos.


Todos os problemas que temos são temporários, apenas a morte não poderá ter solução. Temos de resolver cada um dos imbróglios que nos atormentam a seu tempo, com delicadeza e precisão porque, gradualmente o sentido das coisas vai-se nos revelando por entre o véu de mistério que permanece a envolver todas as questões fulcrais da vida.


“O amor é uma droga dura” da escritora urugaia Cristina Peri Rossi é uma obra poderosa, que se respira e se sente entranhar-se em nós a cada linha que lemos. É muito mais que a história do amor que uma mulher (Aida) desperta no seu narrador. É um ensaio sobre a beleza, sobre a divinização da pessoa amada, o desejo, a sensualidade, a intensidade com que se consumam os devaneios, acompanhada do passagens dolorosas onde se antevê a perenidade de todo o relacionamento. Através de uma escrita muito fluida, rica e imaginativa, esta é uma crónica de um amor que tem uma morte anunciada mas que não deixa por isso de ser menos belo, menos entropecedor, caloroso e hipnotizante; numa palavra: menos humano.

  
Devemos tentar ser interiormente puros, frescos e límpidos como a água de um ribeiro, no dia-a-dia persistentes, arrojados e determinados como lobos, no interior mansos, humildes e dóceis como cordeiros. No meio de tanta ilusão e mentira, uma coisa é verídica: o mundo pode destruir-nos mas a fé levanta-nos sempre.

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