A idealização da espera


Todos temos expectativas relativamente ao que queremos da vida, de nós próprios e das pessoas com quem nos relacionamos. Nem sempre é fácil conciliar esses padrões e directrizes com que a realidade nos apresenta e  não sofrer com os desapontamentos. É um facto que quem tudo tenta controlar, é o primeiro a perder-se. Quando algo falha no seu equilíbrio precário, não se consegue ter atempadamente um mecanismo que permita à pessoa não afundar e manter-se incólume até à próxima oportunidade de restabelecer-se. 
Se a vida parece complicada sozinha, quando abrirmos um espaço para deixar outra pessoa, o mais provável é complicar-se ainda mais. Para além de ter de lidar muito bem com personalidades diferentes, inseguranças e uma multiplicidade de emoções mal geridas que colocam um pano de fundo negativo em que tudo se faça.
Ao procurar-se uma pessoa para amar podemos agir de duas formas distintas. Por um lado, muitos começam relações não sendo particularmente selectivos e escolher alguém com quem nos damos bem, só para ver o que pode acontecer mas sem uma crença profunda em que algo significativo daí surja. No espectro oposto, há quem tenha um nível de exigência tão complexo que aparenta ser inatingível, a roçar a perfeição. Há quem considere muito pouco recomendável ter tantos requerimentos pré-estabelecidos, como uma lista de supermercado em que só se adquire um produto se este conter todos os ingredientes apontados.
É bom viver a vida com liberdade, com abertura de espírito e sem regras definidas, com flexibilidade e sem planos exaustivos de como as coisas têm de ser. É sinónimo de espontaneidade, de uma certa ingenuidade e leveza próprios da juventude. Contudo, tem de haver alguma racionalidade e andar com os pés no chão a maior parte das vezes, sob pena de nos magoarmos gravemente. E quantas mais vezes somos desiludidos, mais difícil se torna acreditar nas pessoas no geral e no amor em particular. Aumenta então a probabilidade de sermos cada vez mais exigentes, esperando ao pormos essa idealização num pedestal tão elevado não sejamos enganadas mais uma vez. Não voltamos a ser as mesmas, para o bom e para o mau, porque houveram partes de nós que desapareceram em desamores tóxicos e cortantes como vidro. 


Encontrar alguém como as nossas expectativas é em si uma ideia um pouco irreal. Não temos o poder de moldar ninguém a nosso bel prazer e tudo o que uma pessoas que conhecermos pode ser é ela mesma. Esperar não deve significar isolamento, pormo-nos num plano longínquo por medo de descer ao mundo onde vivem os comuns dos mortais, porventura diferentes dos nossos sonhos de felicidade duradoura, preciosa e inquebrável.
Não podemos erguer muros entre nós e o resto do mundo senão não vamos encontrar mais nada valioso, seremos apenas prisioneiras da nossa busca pela perfeição inexistente.



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