Rejeições
No nosso dia-a-dia passamos por vezes por situações que danificam a nossa confiança e auto-estima. Somos forçados a colocar máscaras para fingir que determinada palavra ou acontecimento não nos afectou quando na verdade nos fez sangrar por dentro. Por detrás dessa farsa, está a realidade nua e crua, em que despidos de artifícios, vemos as nossas feridas em plena luz do dia. Algumas vão inevitavelmente formar cicatrizes, mais ou menos bonitas, mas vão estar sempre lá e temos de nos acostumar a elas. Vão-se transformar em algo que é nosso e que até podemos aprender a aceitar e amar.
Há fases da vida em que parece que passamos o tempo todo a tentar sair do nível em que estamos mas algo nos trava os movimentos, é como se estivéssemos num jogo qualquer que bloqueou. Por mais barro que se atire à parede parece que nenhum cola. É delicado sermos rejeitados justamente no processo em que ainda estamos a construir a nossa identidade. A adolescência é sem dúvida uma dessas fases marcantes em que qualquer passo em falso pode ferir e deixar cicatrizes. Mas, mesmo quando tecnicamente já somos considerados adultos mantemos uma certa fragilidade que nos torna vulneráveis a críticas externas. Sermos rejeitados no campo amoroso ou no campo profissional dói profundamente. Faz-nos querer esconder num buraco escuro porque de qualquer das maneiras não conseguimos ver o sol. Ficamos presos num ciclo de auto-comiseração, de desgosto, de vazio.
Creio que tal como escreveu Anne Frank, o amor não é algo que se possa pedir a alguém pelo que os seus problemas, para muitas pessoas ficam em aberto, à espera que o tempo lhes traga a solução. Não se controla os sentimentos e o coração é caprichoso, se tentarmos navegar contra ventos contrários vamos ficar duplamente desgastados do que se apenas aceitássemos e nos deixássemos ir ao sabor da corrente. Por isso, confiar no destino e na natureza é para mim tão claro e aconselhável como uma evidência. No que respeita à nossa carreira, se não conseguimos encaixar em nenhum molde por mais que nos esforcemos porque não criarmos as nossas próprias oportunidades, o projecto que os nossos sonhos nos pedem para esculpir à tanto tempo? Temos de banir a palavra "desemprego" do nosso vocabulário e investir o nosso tempo em algo que nos dê gratificação e preencha. Não podemos mais lamentar o tempo gasto a ver anúncios de trabalho por maior que tenha sido, a estudar opções de futuro, a ir a entrevistas em que fracassámos. Tudo isso cumpriu a sua função, que quanto mais não seja foi ensinar-nos algo sobre nós próprios.
Mesmo que o mundo inteiro nos rejeite, temos de nos aceitar, ser o nosso melhor amigo e refúgio de modo a que as pedras que nos atiram não nos atinjam ou apenas o façam superficialmente. Senão, deixemos as cicatrizes contar a sua história e que o final destas acabe com amor e compreensão porque são as duas únicas coisas de valor que temos.
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