Ágora, um dia & Ornatos
Filme: Ágora (2009): Do conceito realizador Alejandro
Amenábar (“Os outros”, “Abre los ojos”, “Mar adentro”) chega-nos a história de
Hypatia, astrónoma e filósofa que dedicou toda a sua vida à busca do saber
(deve-se a ela o mapeamento do corpos celestes, por exemplo). Professora
respeitada, ferozmente independente e defensora do livre pensamento, é uma
mulher à frente do seu tempo, de grande inteligência e força. Amada pelo seu
discipulo Orestes e pelo seu escravo Davus, a sua verdadeira paixão
é a observação dos astros e a busca de um melhor entendimento do mundo.
O filme desenrola-se na época tumultosa do século IV,
em que o Império Romano controlava o Egipto e o paganismo era ameaçado pela
disseminação rápida de uma nova doutrina, o Cristianismo. É sobre essas
mudanças profundamente violentas, que abrem fossos de enorme agitação social
que “Ágora” versa. A destruição da Biblioteca de Alexandria, uma das
maiores bibliotecas do mundo antigo, é um dos momentos mais dramáticos e
intensos do filme, com muitas obras a perderem-se lamentavelmente para sempre.
Alheia a rivalidades religiosas e interesses políticos, Hypatia prossegue fiel
a si própria, convicta na luta pelos seus ideiais à medida que o ambiente à sua
volta se torna cada vez mais turbulento e hóstil. Excelentes interpretações de
Rachel Weisz, Max Minghella e Michael Londsdale, entre outros.
Livro:
“Um dia” de David Nicholls (2009) Emma e Dexter conhecem-se no dia da sua
formatura, a 15 de Julho de 1988. Depois de um prelúdio romântico, os seus
caminhos separam-se, não sem antes começar a construír uma bela amizade que se
irá prolongar, inalterável, durante as décadas seguintes.
“Um
dia” é a jornada de duas personagens muito diferentes: Dexter irresponsável,
inconsequente, proveniente de uma família abastada, que apenas se quer divertir
e aproveitar a vida ao máximo. Por outro lado temos Emma: sensível, ponderada,
de origens humildes que se esforça para subir na vida e sonha tornar-se
escritora e com os seus livros mudar o mundo.
Esta
é mais do que uma história de amor, é sobretudo uma reflexão sobre a partilha e
um relacionamento humano quase imbricado um no outro de dois amigos que se
conhecem profundamente e acabam por se completar como o encaixe mais perfeito.
Ao longo das inúmeras dificuldades, afastamentos, momentos amargos e doces,
Emma e Dexter superam todas as provas e mostram que é possível encontrar na
vida de todos os dias (aborrecida, frustrante, decepcionante) um pouco de magia
e de compreensão verdadeira; que se pode encontrar na simplicidade algo de belo
e que apenas um dia pode fazer toda a diferença e estender o seu terno
simbolismo até ao fim das nossas vidas.
Música:
Ornatos Violeta “O monstro precisa de amigos” (1999). Segundo disco da banda do
Porto depois de “Cão!” (1997), este é considerado um dos melhores albums de
rock português dos últimos anos. Nele, Manel Cruz, o carismático vocalista e
principal letrista da banda, canta-nos na sua voz de melodiosidade
inconfundível, temas que falam de amor e desamor, da sobrevivência do
dia-a-dia, da superação dos problemas bem como da mágoa e da tristeza. Este
trabalho é um retrato da realidade por vezes cruel, contraditória e díficil de
entender, de questões que se prendem com a identidade e dúvidas existenciais e
com sentimentos (a paixão, o nascer e morrer de uma relação, o esquecimento, a
saudade, etc). A linguagem musical e lírica é tocante e eficente na transmissão
da sua mensagem, com um significado alargado e intemporal. Destaque para além
do incontornável primeiro single “Ouvi dizer” para as canções “Tanque”,
“Chaga”, “Pára de olhar para mim”, “O.M.EN” e “Coisas”.
Falando
sobre a banda, Manel Cruz explica que o projecto surgiu com naturalidade
durante a adolescência e tornou-se coeso à custa de ensaios diários e, de
espontaneidade e entrega total à música. Depois deste segundo disco, a banda
desintegrou-se e o terceiro album acabou por não se materializar. Em causa, ao
que tudo indica estão as mudanças pessoais de cada um dos elementos da banda e
a recusa em gerir os Ornatos Violeta como uma empresa e de comprometer, de
alguma forma a liberdade criativa. Artista plástico para além de músico, Manel
Cruz tem-se desdobrado em outros projectos desde o final da sua banda de maior
relevo: Pluto “Bom dia” (2004) Foge Foge Bandido e Supernada “Nada é possível”
(2012). Em entrevista ao Disco Digital, Manel Cruz explica a ramificação de
incursões musicais de curta duração em termos simples: “O que acontece é quando
o meu trabalho de alguma forma se afirma, normalmente eu já estou noutra. É uma
questão de inquietude criativa, acho mesmo normal, já que o trabalho de um
criativo é criar e não repetir”.
Certo
é que o “Monstro precisa de amigos” marcou decisivamente a música portuguesa
(de tal ordem que consignou aos Ornatos Violeta um estatuto quase mítico) e
falou à juventude do final do século XX assim como continuará seguramente a
influenciar e a falar às próximas gerações.
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